quarta-feira, 29 de julho de 2009

A Crítica à Meritocracia Pura

Este texto é dedicado a pessoas, profissões, coisas, bichos, enfim, qualquer coisa que passa quase totalmente despercebido, mas que tem importância fundamental no contexto em que se encontram.

Oboé - Quase todo mundo já assistiu a uma orquestra tocar. Viu o maestro, viu uma dezena de violinistas, viu até o contra-baixo. Se tem solista, viu o piano. Se tem um instrumento pouco usual, também viu, como a harpa, por exemplo. Mas, perdido ali no meio dos instrumentos de sopro, mais exatamente no naipe das madeiras, da qual também fazem parte a flauta, o clarinete, o saxofone e o fagote, está o oboé. O oboé clássico tem uma sonoridade melancólica. Os oboés piccolo tem um som de instrumento de sopro árabe. E toda orquestra tem um oboé !!! Trata-se de um instrumento antigo, cujo nome não vem do árabe, como muitos pensam e sim do francês huitbois, ou alto sopro, pelo seu timbre mais agudo. E o que tem o oboé de mais ? Simples. Apesar de dificílimo de tocar, ele não desafina. E o oboé clássico emite o som neutro em Lá. Então, antes do maestro entrar para um concerto, entra o violinista spalla, ou primeiro violinista, que fica à esquerda do maestro e faz um sinal para o oboísta (nome do cidadão que aprendeu a tocar oboé) emitir um Lá. Ele emite o Lá e então todos os outros músicos tocam o Lá e fazem a afinação final. Só aí entra o maestro. Nos intervalos, se o maestro percebe algo estranho em algum instrumento, cutuca o spalla ( espécie de maestro regra três), e lá vai o oboé de novo atacar de Lá, para todos se afinarem. O oboé é, portanto, uma espécie de diapasão da orquestra.

Montador de Punga - Punga é aquele cavalo mansinho que chega perto de um puro-sangue mais nervosinho, antes ou depois de um páreo, normalmente porque o jóquei que monta o puro-sangue está tendo algum pequeno problema para levar sua montaria ao destino certo. O montador do punga se encarrega de, além de levar o punga, claro, controlar o outro cavalo mais arisco. Antes do páreo, fica ali atrás do "starting gate", ajudando nos trabalhos de colocar os mais arredios nos boxes de partida. Então, o montador do punga, que não aparece nem no rodapé do programa de uma reunião ( como se chamam as sequências de páreos), trabalha em todos os páreos, corta a mão tentando segurar o outro cavalo nervoso, às vezes vai ao chão, ganha menos de salário do que custa a ração dos puro-sangues, mas sem ele ia ter muito "barata voa" antes e durante o cânter, nas baias, no "starting gate"...ou seja, sem o punga e, principalmente, sem o montador do punga um páreo poderia levar horas para ser preparado.

Proeiro - Proeiro é o sujeito que faz parte da tripulação de um veleiro mas não é o comandante. Pau para toda a obra. Seus requisitos são: agilidade de macaco, força de elefante, olhos de gavião, ouvido aguçado e sonar acoplado, resistência etíope, pescoço de girafa, autonomia infinita sob a água, peso ideal, sem uma grama a mais ou a menos, e total insensibilidade à dor. Tem que ter uma capacidade de levar broncas que são capazes de revolver dos túmulos umas quatro gerações de ancestrais e ficar quieto. Levar a culpa se a regata foi perdida e ser esquecido se a regata for ganha. Não levanta o troféu e não lê o nome na lista de resultados. Mas um comandante não veleja sem eles. Tem alguns que até cumprimentam e agradecem aos seus proeiros em determinadas situações. Mas são raros.

Rolamento - Entre o eixo e a roda vai uma coisa chamada rolamento. Só serve para que o eixo e a roda não se desgastem. Quando olharem um carro, imaginem que entre o eixo e as rodas existem dois anéis que servem de "trilhos" para bilhas, ou roletes deslizarem. Eles existem para que os eixos não durem apenas alguns quilômetros e as rodas não se acabem com o atrito. Por serem compactos, os rolamentos são muito bem lubrificados e resistem a muitas pancadas e intempéries. No entanto, quando um dá defeito, começa a roncar e o dono do carro, via de regra fica irritado. Em primeiro lugar, pelo barulho insistente e que aumenta mais ainda quando a velocidade aumenta. Em segundo lugar, porque é uma peça cara. Mas pouco se leva em consideração a folha de serviços prestados pelo rolamento ao longo de sua vida útil. Aguenta porrada, lama, água, buraco, pneu furado, e, salvo mau uso extremo, é uma das últimas coisas do carro que vai quebrar. Mas não adianta, quebrou, é xingado, jogado no lixo impiedosamente e lembrado como vilão. Eu já vi fanático por automóvel guardar como peça de museu virabrequim, pistão, válvula, e até cano de descarga. Rolamento eu nunca vi ninguém guardar.

Gandula - Não joga, é xingado, apanha às vezes, não ganha salário, mas sem eles um jogo de futebol duraria uma eternidade. Com jogadores como o Lúcio, o Edcarlos e o Obina, as bolas iriam muito frequentemente ir parar muito longe. Os gandulas resolvem este problema, devolvendo as bolas rapidamente. Bem, quando o time da casa está ganhando os gandulas diminuem a velocidade ou jogam bolas em quantidade superior à desejada que é de 1 (uma) bola apenas. E quando o time da casa está perdendo alguns gandulas se empolgam indevidamente. Antigamente ainda havia o prêmio de poder estar perto dos craques e ver o jogo de graça, mas como hoje não existem mais muitos craques e os que existem podem ser vistos até em biroscas da Vila Cruzeiro, com travestis ou em boates, e a Gatonet é muito mais legal que ir ao jogo, nem isso vale mais a pena. Então, atualmente ser gandula é um ato de desprendimento absoluto.

Barata - Bicho que não serve para nada, mas nada mesmo e dizem que em caso de hecatombe atômica só sobreviveriam as baratas e o Oscar Niemeyer. No entanto, as baratas prestam dois favores inestimáveis. O primeiro: se aparecer em restaurante, a conta sai de graça. E segundo: se você matar uma barata na frente de uma namorada nova, pronto , você é o novo super-herói dela, um deus grego, um Maciste, um ser imbatível diante das maiores forças da Natureza.

É só olhar em redor e mais coisas importantíssimas aparecerão e, questão básica e imediata: tem o reconhecimento que merece ?

2 comentários:

  1. Hoje estava conversando com um amigo sobre jogadores sensacionais que sucumbiram a uma geração. Por exemplo, o Andrade que jogou na mesma época que o Falcão e o Cerezo. É quase a mesma coisa, se pensar direitinho. Sem o Andrade, aquele time do Flamengo seria aquele time do Flamengo? Mas só lembram do Zico, Junior, Leandro, Adílio...

    Mas essa idéia é minha, nada de criar um post sobre o tema.

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  2. Muito bom o texto de hoje, gostei muito !

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